Ainda não perdoei o meu pai…
Meu pai era um homem amargurado. Ontem, ao ver o pai de Elton John no filme Rocket Man, lembrei-me um pouco disso. O pai do gênio musical nunca foi ver uma apresentação do filho. E talvez a dor de nunca ser acolhido por este pai serviu de motivação para que o artista se mostrasse ao mundo. A dor é um grande propulsor. Mas é também um veneno perigoso.
Pegando uma carona no drama, reconheço-me diversas vezes tentando provar para o meu pai que eu sou um bom filho e não merecia ter sido abandonado por ele. Assim, realizo coisas, escrevo, trabalho, ensino, vou para o mundo. Lógico que existe verdade naquilo que faço. Sem verdade, um movimento não se sustenta muito tempo. Mas a dor da criança ferida acompanha as ações do adulto inspirado. E esta criança fica sussurrando, o tempo todo: você não foi visto. Ele te deixou! Mostre pra ele que ele foi um idiota. Fracassado! Ferida, a criança não vê prazer nas coisas que conquista. E não raro, começa a boicotar o sucesso.
Este é um processo cíclico. Para quem está no mundo da terapia há muito tempo, sabe que existem períodos de reavaliação. O desenvolvimento pessoal não é linear. São fases, movimentos elípticos que se aproximam dos traumas diversas vezes na vida, mas em geral, de forma cada vez menos impactante.
Não há mal nenhum em perceber que ainda carrego mágoas do papai. Ou dores não resolvidas. É até bem gratificante perceber isso, pois aí posso olhar. Entrar em contato com a dor interna, e deixá-la ir. Ver que ainda o vejo como um fracasso. E ver que parte de mim ainda age querendo confrontá-lo. E de maneira diferente, torno-me um fracasso, como assim é a imagem interna que carrego. “Ok, papai! Estou olhando para você, mais uma vez! E por falar nisso, é bom olhar! Ainda temos ajustes a fazer. Estou tentando crescer! Um dia, espero vê-lo de forma adulta. Mas enquanto isso não ocorre, permita-me bater o pé! Ficar emburrado. Porque nem isso pude fazer, depois que você foi embora.”
Alex Possato