Bendito fundo do poço
No meu computador, rolando um Led Zeppelin… acabando de retornar da aula de yoga… um friozinho gostoso em Sampa…
Recebo hoje a feliz notícia do meu amigo Newton Lakota, de Brasília, que o grupo que facilitarei juntamente com Luciana Cerqueira, em Alto Paraíso, está praticamente fechado.
Logo me vem a memória: em 2012 as coisas não estavam nada bem. Uma dívida de mais de duzentos mil reais no banco, cartão de crédito estourado, conta corrente bloqueada, nome no Serasa e SPC… Os movimentos do meu trabalho incertos, minha autoconfiança lá no chão. Mas havia algo que me sustentou: a minha fé, a minha iniciação espiritual… e toda a experiência, a enorme experiência que adquiri ao tocar uma empresa durante anos a fio, sem lucro, carregando um piano de cauda enorme nas costas. Criei calo, aprendi a negociar, a entrar em contato com fornecedores, a contratar, a demitir, a perder. Ao mesmo tempo em que a vida me desafiava a cada dia na sobrevivência, os resultados iam, gradativamente, me dobrando.
Precisei ir ao fundo do poço, perder absolutamente tudo – a empresa, a casa, muitos bens, o casamento, o orgulho, para entender uma lição básica sobre prosperidade: a prosperidade está a disposição daqueles que sabem lidar com ela respeitosamente, como um serviçal, promovendo o crescimento de outros, ao mesmo tempo em que utiliza o dinheiro com desapego e humildade. Mas reverência.
Sempre agi como uma criança mimada, achando que Deus deveria olhar para minhas dores financeiras, afinal, eu era (me achava) uma pessoa boa, honrada, cumpridora das minhas responsabilidades sociais e espirituais. Não percebia o quanto de arrogância havia nesta cobrança interna. Certa vez, um fornecedor evangélico da minha empresa disse: há que se temer Deus. Cheio de preconceitos, entendi o que ele disse como uma distorção, afinal, para mim, Deus é paz, amor, plenitude, bondade absoluta.
Tardiamente, porém, percebi de outra forma: a partir do meu ego arrogante, era importante temer a Deus. Pois ele iria punir minha arrogância. Entendo que, pela lei da ação e reação, da mesma forma que eu dava mediocridade, orgulho, medo, avareza e vitimismo ao mundo, o universo me retribuía, com perdas financeiras.
Uma poesia do poeta persa Rumi, diz: “há centenas de maneiras de ajoelhar e beijar o chão”. Provei uma delas: ser jogado ao chão, dobrado, rendido. E hoje digo: graças a Deus! Não me vejo muito melhor, nem muito menos arrogante que antes, mas uma lição ficou clara – estou a serviço do universo, em primeiro lugar. Validando-me ou não, tenho algo a dar, e ao dar, a prosperidade se mostra. Era necessário ocupar o meu lugar, servir através do meu trabalho, e antes eu queria que o trabalho servisse aos meus propósitos de enriquecimento. Vindo de uma família pobre e comunista, filho de um pai anarquista, mãe sempre com dívidas, vivi com pessoas que sempre olharam para o dinheiro com desprezo, dor, luta. Cresci ouvindo que o trabalho era a exploração do sistema capitalista sobre o proletariado. Desconstruir minhas crenças e emoções sobre dinheiro, trabalho, riqueza… precisou anos. E muitas quedas. Acabei repetindo o que aprendi: dívidas, desprezo ao dinheiro, visão distorcida sobre o labor, inveja dos ricos.
Hoje vejo o trabalho como um dos caminhos mais bonitos para a espiritualidade. É no trabalho que encontro os milagres divinos acontecendo. Consigo olhar para a beleza das pessoas, onde antes, minha mente julgava feiura. O trabalho proporciona sorrisos, curas, lágrimas de redenção. Provoca-me o tempo todo a sair do meu lugar de “agente” e colocar-me no lugar de “instrumento”. Destrói minhas ideias mais arraigadas, para demonstrar que, no fundo, tudo é amor. Mói, desmonta, pulveriza meu ego, e às vezes, até vislumbres do ser imortal que me habita me é permitido vivenciar. Nada disso teria ocorrido sem o fundo o poço. Bendito fundo do poço! Não sei se ainda lido bem com a prosperidade. Nem o quanto realmente estou em paz com o dinheiro. Mas fato é que muita coisa mudou. E somente por hoje, agradeço!