Por Alex Possato

O que é constelar, para mim?

constelacao

A constelação familiar sistêmica, para muitos, é algo incompreensível. Como que as pessoas, sem se conhecerem ou sem saber das histórias pessoais e familiares dos constelados, podem assumir postura, tom de voz, movimentos e até falar como se fossem alguém do sistema familiar? De onde vem as emoções, que surgem do nada, e se vão também do nada? Por que o corpo fica tomado por algum tipo de energia, que nos faz perder a força, ir ao chão, ou ao contrário, nos deixa eretos e cheios de poder?

Por tudo isso e muito mais, uma roda de constelação instiga o imaginário, as crenças espirituais e facilita uma confusão com questões sobre mediunidade, energias – seja lá o que isso significa, telepatia, hipnose, obsessão, incorporação, animismo, etc., etc., etc.

Constelação é terapia

Tenho minhas crenças espirituais e de tudo isso que falei acima, diria que aceito e entendo o lugar de cada um destes aspectos. Trilhei vários caminhos religiosos e sou realmente uma pessoa muito conectada com todo este tipo de conhecimento espiritual, filosófico, energético – o que é isso mesmo? – parapsicológico, ritualístico… porém, lembro que a constelação familiar sistêmica tem como objetivo prioritário o trabalho terapêutico.

E uma das principais características do trabalho terapêutico, baseado no fundador da constelação, Bert Hellinger, é incluir tudo o que foi, do jeito que foi. Entendemos, como facilitador do processo, que as pessoas participantes de uma roda terapêutica estão com seus problemas ou manifestando sintomas porque não conseguem incluir algo, alguém, uma situação, uma dor ou emoção. “Nosso ser se enriquece se permitimos que tudo seja como foi, que siga para sempre como foi e que nós também nos concedamos o direito de ser tal como somos, junto a tudo. Juntos de que maneira? Com amor por tudo o que foi e segue sendo em nossa vida”, ensina Hellinger (trecho extraído do livro Liberar el Pasado, da terapeuta canadense Galina Husaruk).

Por exemplo, não conseguimos incluir a amante que papai teve. Em geral, porque a mamãe também nega este amor de papai. E nós, inconscientemente, carregamos a dor da exclusão deste amor, dentro de nós, às vezes provocando a dificuldade de nos estabelecermos em relações afetivas. Nos portamos como se não merecêssemos uma relação duradoura. Às vezes, nos descobrimos como sendo o outro, ou a outra, numa relação afetiva. Um outro exemplo: negamos, sem saber, a morte do nosso tio, que faleceu com 2 anos de idade, vítima de um acidente doméstico no qual a nossa avó se sentiu totalmente responsável. E culpou também o vovô por não ter estado no momento do acidente. E assim nos vinculamos a dor de perder precocemente alguém muito querido, além de carregarmos uma culpa inexplicável por algo muito grave que irá acontecer. Vivemos com um peso inconsciente, uma sensação de morte, de segredos não revelados.

Esses aspectos, e tantos outros, são profundamente importantes para entendermos os padrões inconscientes que nos fazem agir, sem que saibamos, rumo a repetir estas situações do passado, como forma de honrar a dor vivida pelos nossos pais ou antepassados.

Observe estas perguntas:

  • Por que nos isolamos?
  • Por que sentimos a sensação de abandono?
  • Qual a causa da sensação de carência financeira?
  • Por que sinto raiva dos homens (ou das mulheres)?
  • Por que não me sinto parte da família?
  • Qual o motivo de permitir-me ser manipulado?
  • De onde vem esta agressividade contra as injustiças?
  • Qual o motivo de eu manipular os outros, para que façam as coisas como quero?

Muitas vezes, estes exemplos de padrões de comportamento e/ou emocionais estão influenciados por traumas vindos do passado. Histórias não digeridas, vividas nas gerações anteriores, continuam. E carregamos em nossas células, pedindo para serem vistas. Porém, a grande virada possível está em nossas mãos: padrões vistos se transformam em poder. Em compaixão. Em inteligência emocional. Em cura. Incluindo, harmonizando os padrões dentro de nós, nos convertemos em membros mais capazes de perpetuar o sistema familiar com eficiência e saúde.

 

Constelar é incluir – para incluir, é necessário maturidade

Sim, a constelação tem a sua magia. E uma coisa que sempre ocorre, é a magia da sincronicidade. Em 100% das vezes posso dizer que as constelações que facilito demonstram aspectos meus que também não foram incluídos. Costumo dizer que estou constelando a mim mesmo, através de outros. Quantas vezes surge a mesma história que tive com meu irmão, na minha frente. Ou a dor do abandono, que vivenciei na infância. Ou ainda, a minha rebeldia, a incapacidade de acatar as ordens dos “superiores”. Carl Jung, o descobridor do movimento da sincronicidade, diz: “O principal objetivo da terapia psicológica não é transportar o paciente para um impossível estado de felicidade, mas sim ajudá-lo a adquirir firmeza e paciência diante do sofrimento. A vida acontece no equilíbrio entre a alegria e a dor. Quem não se arrisca para além da realidade jamais encontrará a verdade”.

Por isso, a maior parte das vezes que constelamos, olhamos para aspectos difíceis de nós mesmos. Mesmo que os traumas tenham se originado lá atrás, no passado familiar longínquo, o sistema está rodando dentro de nós. E se analisamos nossas ações, sabemos muito bem que somos responsáveis pelas coisas que acontecem em nossa vida. Este é o papel da terapia. Trazer luz à sombra. E garanto para você: o trabalho, via de regra, é sempre maravilhoso!

Nosso mestre Bert Hellinger diz que estamos identificados a um peso, por amor. Um amor infantil, que não leva à resolução em nenhum aspecto, mas que nos dá uma sensação de pertencimento. Através do sofrimento, nos sentimos pertencentes à família. E nos colocamos numa posição de sacrifício. Algo muito próximo ao mito de Jesus crucificado. Preferimos morrer – simbolicamente (fracassar na saúde, nas finanças, no sucesso, nas relações), para salvar papai, mamãe e antepassados. É um mecanismo inconsciente. E durante a constelação, não raras vezes, este amor se mostra. Grandioso. Profundo. Intenso. E a inadequação deste amor doentio, a falta de resolução, também se mostra. Isso provoca um enorme alívio a todos os participantes, quando é possível se libertar desta identificação amorosamente desastrosa.

Como falei acima, a magia da sincronicidade nos faz ver que também estamos carregando pesos enormes, com a vontade inconsciente de salvar papai, mamãe ou alguém que nem sabemos. E ao poder vivenciar a despedida deste padrão, sentimos um grande alívio. Não somente quem está constelando, mas todos. Inclusive eu – o facilitador.

Incluir é permitir a existência de um sentimento difícil, dentro de si

Quantos clientes recebo que desejam simplesmente eliminar o problema! Dizem-me, por exemplo: tenho fracassado financeiramente há mais de 20 anos. Não suporto mais isso. Ou: meu relacionamento afetivo está um desastre – quero uma solução! Ou ainda: meu filho não estuda, não trabalha, não colabora – quero mudar isso! É lógico que todos desejam soluções para seus problemas, mas vamos ser bem sinceros: se eu estou buscando uma terapia para mudar uma situação qualquer ou mudar alguém, no fundo estou querendo uma mágica! Vou pagar uma consulta que irá mudar a situação para o jeito que eu desejo… assim deve estar pensando, de um jeito inocente e infantil, a pessoa.

Então, eu sempre alerto, ao ouvir este tipo de questão: não é desta forma que iremos trabalhar. O problema é algo muito importante na sua vida, um verdadeiro portal que está direcionando o seu foco para algo excluído. Estamos fazendo terapia – estamos trabalhando para você mudar a sua forma de ver a si, aos outros e à própria vida. Existe algo emocional que está impedindo a sua vida de ser mais leve. Vou dar alguns exemplos possíveis e práticos:

  • A pessoa está passando por situações recorrentes de abandono nos relacionamentos. Às vezes, por detrás desta história, há um noivo amargurado, deixado pela mãe que foi instruída a casar-se com outra pessoa. Qual é o desafio deste cliente? Aprender a lidar com a dor da rejeição.
  • Alguém deseja trabalhar a dificuldade financeira. Que ela vive, o pai já viveu e os avós, que vieram de outro país, fugidos da pobreza, também viveram. O que este cliente precisa aprender a incluir, internamente? Talvez a vergonha de não poder pagar a escola que deseja aos filhos. Ou saber lidar com o nome sujo na praça.
  • Um outro cliente vem com uma questão de saúde: uma doença grave o acometeu. Não sabemos qual a origem dela, mas invariavelmente, a constelação irá mostrar alguma exclusão do passado. Um amor traído. Um filho abandonado. Um aborto não visto. Uma relação que acabou em violência. Porém, qual é a inclusão que este cliente está sendo chamado? Quem sabe olhar para a própria impotência, diante da doença? Aprender a incluir a morte, como uma possibilidade bem real. Estar em paz com as despedidas…

Este é um aspecto que precisa ficar bem claro. Incluir algo na constelação não é dizer: ah! Eu incluo o aborto que tive! Ou: sim, claro! Vovô teve muitas amantes e elas fazem parte! Quem sabe: eu incluo a morte, a morte faz parte! Quando incluímos, o que falamos não importa, porque estamos lidando com sentimentos. Incluir a traição, por exemplo, significa sentir-se mal, perceber talvez a raiva, o medo do abandono, e dizer: ok! Eu permito. Isso faz parte e eu dou conta destes sentimentos dentro de mim.

Tudo isso pode parecer difícil no começo. E é, não vou negar. Lidar com nossas dores internas é muito duro. Porém, “o homem que não atravessa o inferno de suas paixões também não as supera”, diz Jung. Terapia exige esta postura. E na minha visão pessoal, preciso dizer: é muito bom! Fazer terapia é um caminho fantástico, pois nos descobrimos humanos. Humanos na nossa luz e na nossa sombra. Emoções contraditórias! Humores diversos. E desta forma, aceitamos os desvios dos nossos pais e antepassados. Todos eles, conforme aprendemos a amar os nossos desvios. Aquilo que negamos em nós. Logo, o amor começa a fluir de um jeito que nunca antes foi possível: o amor da inclusão. O amor da compreensão da alma. O amor que somente nossas emoções profundas, em paz, consegue propiciar.

Alex Possato

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