Por que os homens desaparecem
Por Alex Possato

Por que os homens desaparecem

pai

Dias desses vi um video no Youtube que me chamou a atenção: um homem, filho de um pai que teve uma relação casual com a mãe, esta engravidou, e o cara pulou fora. E no video, entre pitadas de bom humor e cutucadas contra homens que não cuidam dos filhos, ficou a mensagem da necessidade de criar mecanismos que auxiliem a cuidar das crianças que crescem nesta situação. Sem pai.

Em primeiro lugar, gostaria de dizer aos leitores deste texto de que escrevo a partir do olhar de um homem. Um menino que também não foi criado pelo pai. Nada contra as meninas, mas quero falar da minha experiência como homem, ok?

 

Então, prosseguindo… Se uma criança não tem pai, também não tem mãe. Pelo menos não totalmente. Por quê? Porque a mãe precisa se desdobrar para sustentar financeiramente a casa. Precisa dar conta da própria TPM, da variação de humor e emoções… Precisa namorar ou cuidar do trauma de ser uma mãe sem um homem ao lado. Precisa lidar com o seu tesão e com o medo de dar, e ser usada como objeto. Ou ainda com o seu jogo de usar os homens, e descartando-os… para fazê-los provar do próprio veneno. Precisa carregar o fardo de ser mãe sem, talvez, querer ter sido… Ou a culpa de querer ser melhor mãe do que dá conta de ser…

Não gosto de generalizações nem de levantar bandeiras. Vivemos momentos conturbados, onde homens, mulheres, pais, mães, filhos, ninguém sabe qual é o seu verdadeiro lugar. Acreditar que “se” houvesse uma família composta por pai, mãe e filhos, cachorro pulando no quintal ensolarado, a Santíssima Trindade tornada real no almoço do domingo, sob a tela do Faustão, garantiria a felicidade do universo é, apropriando-me da frase que ouvi de Bert Hellinger, um “pensamento mágico infantil”.

As crianças vivem um mundo dourado de fantasias. O menino olha o seu pai, e mesmo que ele seja o maníaco do parque, para ele, o pai é o herói. O homem mais belo do planeta. Mais forte. Mais inteligente. Até que, em algum momento, o santo despenca do altar.

Às vezes, nem há essa figura masculina para ser colocada no pedestal… O que não impede ao menino de fantasiar… Às vezes, a imagem deste homem é, mílimetro a milímetro, desfragmentada em milhares de cacos, porque ele bebe, ele fuma, ele não tem dinheiro suficiente, ele grita, ele não faz nada, ele bate, ele trai, ele mente, ele some… E em geral, a mãe tem grande colaboração na demonização do masculino: seja ativamente, ou passivamente. E o masculino tem grande responsabilidade em ser visto como uma porcaria… seja pela omissão. Seja pelo excesso de força.

 

Se olhamos com olhos de adultos, facilmente entendemos essa verdade: não há santos nesta história. Não há justos. Ou injustos. Estamos todos no mesmo barco e sofremos igualmente: sejamos pai, mãe, filhos… Mas como é difícil olhar para a própria história, como adulto, não é mesmo? Não se culpe. Robert Bly, autor do livro João de Ferro, um clássico sobre a transformação do papel do masculino na sociedade, já dizia ver, nos anos 70, uma fragilização do masculino exagerada… Homens que despertavam para o lado feminino de si, para o emocional, para a intuição, para a criatividade, a fluidez –  o que é muito bom! – mas ao mesmo tempo, não tinham energia vital. Pareciam mortos, zumbis, sem brilho no olhar, sem a faca nos dentes, sem masculinidade… começavam a falar de si e já entravam num chororô…

Eu diria que falta pai ao homem que se reconhece nesse estado. É o pai que irá dar força. E para encontrar o pai, dentro de si, é necessário olhar para a própria história. Reconhecer o próprio pai, toda a dor e todo o amor que você tem por ele.

 

Filho do homem invisível, precisa desaparecer

 

Tudo o que ocorre na nossa vida é exatamente aquilo que precisava ocorrer para que pudéssemos nos desenvolver como seres humanos. Sendo terapeuta, além das minhas próprias feridas, ouço e trabalho com as feridas de centenas de pessoas. E descobri uma coisa: o problema não é a história que ocorreu no nosso passado. O que nos causa grande sofrimento e perpetua a agonia é a não aceitação do que ocorreu na nossa história. O problema não é não ter pai. O problema é não aceitar que não tive um pai presente. E não aceitar a dor de não ter um homem, adulto, quando precisava de alguém para me defender. Não aceitar que não houve um homem, adulto, para me mostrar como me safar dos perigos da jornada. Não aceitar que não houve um homem para me mostrar como é que um homem procede na cama, como lida com a sexualidade… Não aceitar que não houve um homem na minha formatura, no momento de levantar a medalha do judô, no momento de mostrar a primeira namorada. Não aceitar que não houve esse homem, que me mostrasse o caminho do trabalho, da arte de ganhar dinheiro, de crescer profissionalmente… É não aceitar que não houvesse um homem que me mostrasse, de verdade, como é grandioso ser homem…

 

Tenho certeza de que muitos de vocês tiveram um pai mais próximo, fisicamente dizendo, mas ao mesmo tempo, muito do que escrevo acima faz parte da sua história. Se abandono fosse a causa de todos os males emocionais, eu não receberia clientes de terapia que tiveram pai e mãe dentro de casa. E isso não é verdade. Muitos, muitos mesmos, tiveram um pai em casa. Mas não tiveram. Se é que você me entende…

 

O que acontece, quando não aceitamos a história nossa? A constelação familiar sistêmica demonstra: repetimos. Às vezes, repetimos a história. Você, como homem, se vê compelido a abandonar suas parceiras. É como se uma força invísivel o atraísse para longe do relacionamento. Assim, você se torna igual ao seu pai. Um homem que desaparece. Ou, então, você se torna o homem invisível dentro de casa. Não está disponível para nada. Se esconde atrás do jogo de futebol, dos amigos, dos livros, da cultura, do cigarro, da pornografia, da cerveja, da política, do churrasco… evita o diálogo e não consegue expor uma verdade básica: você não está feliz na relação, com a mulher ao seu lado. Você não se sente bem como pai. Você não dá conta das responsabilidades de casa. Está de saco cheio!

Talvez você não perceba, mas em algum nível, você faz o mesmo que papai. Inconscientemente, está dizendo: “papai, eu sofro o mesmo que você. Eu honro você na sua dor. Sofrendo a mesma dor. Porque eu te amo!”. Vagarosamente, você vai atraindo o destino: deixar ou ser deixado. Sentir-se não visto. Não validado. Não pertencente. Não realizado. Sem força. Sem motivação. E aquilo que você mais quer, que é unir-se a uma mulher e sentir-se verdadeiramente “uno no amor”, nunca ocorre. O vazio irá permanecer indefinidamente.

Até quando? Até o momento em que você, corajosamente, enfrentar a sua história. As suas dores. E aceitá-las. Com todo o fel e todo o mel que ela gerou, em seu fígado. Sim, papai me machucou muito. Machucou muito mamãe. Mas mamãe me machucou muito também. Me transformou numa “mocinha”. Me influenciou a demonizar papai. Esta história é deles. Essa relação foi a relação deles. Eu aceito isso como foi. Hoje, sou um adulto. E não mais aquela criança frágil, que tremia de medo ao soar dos primeiros gritos. E também tremia de medo ouvindo aquele silêncio sepulcral… papai de um lado, mamãe de outro. Ambos fingindo que estava tudo bem… mas eu sabia que não…Tremia só de pensar que papai iria deixar mamãe. Ou chorava porque eles não estavam mais juntos. Chorava de raiva. E disparava essa raiva na rua, no futebol, nas meninas, na desobediência, na indisciplina… Aquela criança que mal respirava, achando-se culpada dos problemas de papai e mamãe.

 

Isso já passou. Eu cresci. E aprendi com tudo isso.

 

Diga para si:

Hoje estou aqui. O homem visível. O homem presente. O homem maduro. Eu posso viver sem papai. E posso viver sem mamãe. Mas honro a ambos, em meu coração. E irei arriscar escrever uma outra história. Do meu próprio jeito. E me abrirei ao Amor. Ao verdadeiro Amor. Que inclui todas as dores. E também inclui todos os prazeres. Eu digo sim ao Pai. Eu digo sim ao Amor. Eu digo sim, à Mãe. Eu digo sim, à mim mesmo.

 

 

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