O homem amordaçado
Muitos de nós, homens, esquecemos de como colocar limites. Deixamos nosso castelo ser invadido. Vemos os comandos que damos aos nossos filhos serem desvalidados. Aparceira, a mãe, o pai, a sogra, o papagaio, todos dão seus pitacos em como devemos agir. E nós até queremos opiniões, porque não sabemos o que fazer. Como fazer.
Desaprendemos a falar: não! Chega! Respeite-me!
Não sabemos o que queremos.
Talvez pela sombra dos desmandos do machismo predador e autoritário dos nossos pais, avós, bisavós, ficamos mais dóceis. Ou mais calados. Tudo é negociável. Quantas vezes deixamos de exercitar o poder da escolha? Preferimos nos retirar para a frente da televisão, para atrás do copo, para a escrivaninha do trabalho, para o jogo de futebol… enquanto isso, o circo pega fogo. A mulher nos chama de omissos! Com razão, afinal, não nos colocamos. Mas também sem razão, porque ela ocupa espaço demais.
A mulher conquistou seu lugar. Isso é muito bom. Ela pode, hoje, viver até sem um homem. Não depende mais dele. E o homem? Não sabe mais qual é o seu lugar.
Sumimos de cena. Não somos mais totalmente responsáveis por prover. Muito menos por proteger nossa família. Nem por liderar e dar os comandos. Não sabemos o que fazer com nosso desejo sexual insaciável. Podemos cuidar dos filhos. Trocar fraldas. Cozinhar. Sair com o cachorro. Passar roupa. Fazer faxina. Costurar. O serviço que vovô dizia – isso é coisa de mulher! – não é mais. E daí?
Qual é o nosso lugar? Não desejamos reverter a situação. É bom ter alguém para dividir as responsabilidades da vida. Tanto para o homem, quanto para a mulher. Mas me diga: qual é o nosso espaço? Onde podemos exercer o nosso poder de homem, tão importante para manter ereta a nossa força masculina? Onde podemos dizer: eu quero isso! Chega! Não! Minha palavra tem valor!
Pela falta de exercitar este poder, nossas relações vão ruindo, dia a dia. A mulher também deseja um homem ao seu lado, para que ela possa relaxar um pouco. Sentir-se acolhida, protegida. Segura. Como muitas vezes, não há este homem ativo e participante, ela assume o papel. Com raiva. E depois cobra a presença masculina. Que se sente confrontado. E acuado. E some ainda mais.
Nós, homens, aprendemos a ser assim. Somos filhos de mães dominadoras. E pais fracos. Ou pais autoritários, e mães vítimas. Ou ainda, mães presentes, pais ausentes. Raramente, pai presente, mãe ausente. E por negar o padrão dos nossos pais, queremos fazer algo muito melhor. Mas não deu certo. Ao negar nosso pai, negamos nossa masculinidade. Sob a sombra da mãe, nos tornamos dóceis demais. Fracos. Perdemos a direção. O foco. O poder.
Não vejo outra solução, a não ser resgatar o pai e a mãe dentro de nós. Resgatar as feridas do relacionamento com nossos pais que ficaram em nós. Validar nossos pais e nossa história, por mais difícil que tenha sido. O primeiro grito masculino deve ser de integração e independência em relação ao passado. Se hoje, somos homens massacrados e calados, aprendemos isso em casa. Quando éramos muito pequenos. Como homens, precisamos cortar o cordão umbilical da nossa mãe. Amorosamente. Respeitosamente. Mas cortar. Corajosamente. Adeus, mamãe! E assumir o poder masculino que vêm do nosso pai. Do nosso avô. Bisavô. Tataravô. Tantos e tantos guerreiros, que deram suas vidas para que pudéssemos nascer. E também se despedir: adeus, papai! Vou honrá-lo, com a minha felicidade! A mordaça deve cair. Para valorizarmos o fato, óbvio e simples: somos homens! Podemos agir diferente dos nossos pais e avós, mas somos homens! Podemos ser mais flexíveis, dóceis, sensíveis, mas… somos homens! Temos desejos, vontades, raiva, necessidade de expressão… e nossa palavra tem valor! Somos homens! Queremos nos relacionar, queremos sexo, queremos amizade! Somos homens… Um homem que não deseja competir, nem contra outros homens, nem contra as mulheres. Homens que querem somente encontrar o seu espaço, e ter o direito de falar. E também, calar. Por vontade própria. E não por sentirem-se acuados.
Alex Possato é um dos coordenadores o projeto Diamante Bruto – o poder do sagrado masculino